Se tem uma coisa que fiz em relação à Notas Sobre Ela, foi pensar. Primeiro eu pensei e repensei se era uma boa ideia solicitá-lo na parceria com o GER. Tinha algo ali que profundamente me incomodava, que gerava um comichão no meu peito, e eu precisava confirmar se estava certa. Torcia para estar errada.
Aí o livro chegou, meses depois, e eu fui lê-lo. Rapidinho, poemas, apenas 120 páginas. E aí eu pensei de novo. Decidi que não ia escrever a resenha logo de cara, pois precisava pensar um pouco mais.
Agora, que sentei no computador para discorrer sobre essa obra, ainda não cheguei a uma conclusão. Ao mesmo tempo em que não quero bancar a chata que procura problema em tudo, não podia ignorar tudo que senti enquanto lia as várias poesias sobre uma mulher. Escritas por um homem.
Notas sobre ela, sobre todas elas e nenhuma delas
A sinopse da obra começa afirmando que o autor “mergulha na aura e no universo femininos, revelando seus matizes, nuances e facetas”. Com estas exatas palavras. Essa construção fraseal me incomodou no fundo da alma. E mesmo que eu tenha passado as últimas semanas tentando fazer a advogada do diabo, ainda acho de uma prepotência indefensável.
Afinal, o que um homem sabe sobre o que é ser mulher?
Ele pode ouvir falar, pode entender, mas ele não sente. E aí, de fato, Notas Sobre Ela, apesar de contar a narrativa de apenas uma mulher, fala sobre todas elas.
Não porque ele realmente acertou, mas porque é um conjunto de informações óbvias. Clichês. Superficialidades. Fiz um exercício e tirando alguns poemas que falavam de parto e etc, todos podiam ser perfeitamente aplicados ao gênero masculino.
[citacao fonte=”Notas sobre ela”]Curtos
Longos
Loiros
Ruivos
Castanhos
Mudar
Ela gosta de mudar
Mudar
Pra continuar sendo ela mesma[/citacao]
Acredito que a falha do autor nesta obra foi não falar sobre a mulher como alguém que ele enxerga e admira, mas como se ele estivesse na pele dela e pudesse saber absolutamente tudo o que se passava ali. Porque uma homenagem, uma visão romântica é não só compreensível como louvável, mas…
Eu não sei. Talvez eu esteja sendo injusta. Talvez não tenha pensado o suficiente.
Apesar de ser a narrativa sobre uma mulher fictícia, todos os momentos foram tragados de uma arrogância ofensiva. Um romantismo falso. Superficial.
Mulher é tudo isso que ele escreveu, mas é muito mais. Muito além. E, sinceramente, parabenizar alguém por ter escrito vários clichês ritmicos como se ele tivesse desvendado um grande mistério do universo simplesmente não me parece certo.
[citacao fonte=”Notas sobre ela”] (…)
Ela enxerga um mundo que as pessoas ainda não podem enxergar
Os livros são esconderijos quando tudo fica cinza demais
Tudo fica sem cor
Onde as pessoas planejam todos os próximos passos
Ela corre para a estante amarela
E se esconde nas páginas imateriais
E fica lá[/citacao]
E ao dizer isso eu não digo que não gostei da obra. Na verdade, tenho vários trechos sinalizados, pois eu achei bonito. Porém consigo enxergar que a beleza que eu vi não me gerou identificação.
Letra por letra, até o ponto final
Explicado meus problemas ideológicos para com a obra, cabe a você concordar ou não. Como esse é um sentimento que me foi despertado, não me preocupo com a possibilidade de alguém discordar comigo. Eu espero que discordem. Essa é uma daquelas poucas vezes na vida que você deseja estar errado, vendo as coisas sob um espectro vago.
[citacao fonte=”Notas Sobre Ela”] Ela tem uma tristeza pequena
Dessas que cabem somente em um pedaço do coração
(…)[/citacao]
Notas Sobre Ela é uma narrativa. Em forma de poesias, sim, mas uma narrativa. Conta uma história. Podem ser lidas isoladamente, mas seu conjunto se potencializa. Sendo uma estilística completamente livre, não ache que vai encontrar muitas rimas. Na verdade, haverão trechos tão rústicos juntos que talvez você sinta a necessidade de ler de novo e ver se entendeu mesmo.
Várias vezes, lendo a obra, perdi o fio da meada.
Em contrapartida, a diagramação é linda. O papel é um tipo de reciclado bem amarelado, com uma espessura ótima. Toda a parte interna é escrita e desenhada em azul escuro. Dependendo da iluminação, a falta de contraste entre o amarelo e o azul podem influenciar um pouco na leiturabilidade, mas nada alarmante.
[citacao fonte=”Notas Sobre Ela”] Ela aprendeu que o amor
Traz um silêncio bom[/citacao]
E por fim, em um parâmetro geral, talvez todo o problema tenha sido a promessa feita sobre o que a obra é. Essa ambição de categorizar. É como alguém que fala que vai te levar uma torta de morango e aparece com um mousse de limão.
Zack não desvenda o imaginário feminino, não revela suas matizes, nuances e facetas. E acredito que, se ele nunca tivesse me prometido isso, minha resenha teria seguido um rumo completamente contrário ao escrevi.
[ficharesenha]
RUDYNALVA CORREIA SOARES
Jade!
Tão bom ver um livro cehio de sensibilidade e que mostra e desnuda a ‘alma’ feminina em diversas vertentes.
Confesso que não conhecia o autor.
Adorei os quotes.
Desejo uma semana carregadinho de luz e paz!
“ Inteligência não é não cometer erros, mas saber resolvê-los rapidamente.” (Bertolt Brecht)
cheirinhos
Rudy
TOP COMENTARISTA novembro 3 livros, 3 ganhadores, participem!
Simone Benvindo
Triste quando um livro não entrega o que promete, ou melhor, quando um autor não entrega no livro o que anuncia na sinopse. Os quotes não me saltaram os olhos . Pelo que percebi possui trechos tão curtos que mal cabem as nuances femininas que dirá as facetas. Depois da sua resenha, não sei se leria.
Beijos
BHLAUREN
Lembro-me de uma professora de português dizendo que “o poeta costuma criar suas próprias estrofes e rimas, sem nada programado” e bom… Eu sou escritora e acredito nisso porque não uso de estrofes ritmadas sempre e um texto não deixa de ter sentido ou não. O texto passa a percepção e julgo até dizer, como um amigo meu certa vez disse, a “hipocrisia” do próprio escritor. Eu acompanho os escritos do Zack e gosto. Primordialmente porque ele não segue um ritmo poético e não existe regra para se fazer poesia ou até prosa poética. E apesar da sua resenha, mesmo que não tenha se identificado (talvez, você não seja essa mulher que ele tenha descrito. Talvez, até mesmo eu não seja. Ou quem sabe a sua vizinha não seja… e por ai vai, não quer dizer que alguém não seja, alguém será), alguém poderá se identificar com os escritos do Zack.
Vamos lá: qual seria a idealização romântica de um homem “perfeito” para você? (Olha só em! Segunda Geração, Romantismo ou O Mal do Século)
Até quem sabe algum dia, tanto faz…
O/
Jade Amorim
BHLAURENLauren, talvez você não tenha entendido muito bem o que eu escrevi, já que eu falei como o problema não foi a identificação, mas como ele arrogantemente se propõe a “mergulha na aura e no universo femininos, revelando seus matizes, nuances e facetas”, e no fim te entrega uma quantidade absurda de clichês e superficialidades que não são nem exclusivas do sexo feminino, principalmente a partir do momento em que ele se coloca no lugar de uma mulher e não se enxergando como alguém de fora. E sobre “idealização de homem perfeito”, acredito que você saiba que isso é completamente diferente do que querer classificar todo um gênero. 🙂