A estante

Ela olhou para cima e viu uma imensa criatura com ares de mariposa passando. Olhou a direita e pôde ver um castelo pontudo no alto de uma colina. Olhou a esquerda e encontrou um casal de mãos dadas, tímidos e chorosos.

Teve vontade de chorar também. Separação sempre lhe deu aperto no peito.

Suspirou. Tirou uma mexa do cabelo pensou o que encontraria se vasculhasse um pouco mais.

Imaginou se sentiria o vento batendo em seus cabelos enquanto cavalgava para salvar uma princesa qualquer, ou aquele medo e ansiedade por ter que lidar com coisas além da sua concepção enquanto lutava pela própria sobrevivência.

Às vezes sabia exatamente o que esperar, outras vezes era uma novidade, uma surpresa agradável, ou não. Tudo bem, não se pode agradar a gregos e troianos e ela sabia disso. Entendia. Aceitava.

Trocou o peso do corpo de pé, estalou a língua, estreitou os olhos. Uma capa vermelha com letras douradas encravadas. Simples o rústico. Pensou o que poderia encontrar ali, um romance água com açúcar, tragédia, alienígenas ou teoria da conspiração.

Bom… isso importava?

É claro que não.

Sorriu enquanto sentia o peso do objeto nas mãos. Não perdeu tempo em acomodar-se, respirou fundo e se preparou para o que viria, fosse o que fosse.

E, por fim, abriu o livro.

“Às vezes, os leitores recordam uma obra melhor do que seu próprio autor. Recordam seus personagens, seus conflitos, sua linguagem e suas imagens com uma benevolência que desarma o romancista que já começa a esquecer tramas e cenas escritas há tantos anos, mais do que gostaria. (…) Espero que você possa desfrutar desse romance e que seja um leitor jovem ou deseje voltar a sê-lo. Gosto de pensar que, com a sua ajuda, serei capaz de recordar melhor esse romance e os dois anteriores e poderei me permitir o luxo de viver a aventura de As Luzes de Setembro e daqueles anos em que eu também pensava que era jovem e que as imagens e palavras eram capazes de tudo.”

– Carlos Ruiz Zafón