Neste dia do jornalista, vi muita gente fazer homenagem. Homenagearam o poder de suas palavras, homenagearam o fato de que trabalhavam de domingo a domingo, também homenagearam a sua função de formador de opinião.
Coisas de mérito, admito.
Mas não me senti representada por nenhum dos milhões de posts de páginas especializadas, não especializadas e nossos amigos escritores de facebook. Não me senti lisonjeada por ouvir que mesmo ganhando uma miséria, a gente continuava na profissão por amor. Nem quando disseram, batendo no peito, que nós somos quem educa fora da escola, sem que nem percebam.
Não me senti lisonjeada com nada que o disseram que o jornalismo me trouxe, tendo ele trago ou não, porque ele me tirou o que eu o que eu tinha de mais precioso e o que foi, por boa parte da minha vida, tudo que tive. As palavras.
Entendam, por favor, que eu nunca quis estar na bancada de um jornal televisivo, como todos que descobrem meu curso insinuam ao menos uma vez. Muito menos quis, nessa minha grande alegria pelo silêncio e desgosto pelo timbre da minha voz, estar no rádio. Não entrei pro jornalismo também pelo cunho social, apesar de conhecer e respeitar cada uma das lutas de meus colegas.
Eu entrei pro jornalismo porque, dentre tudo que eu poderia fazer e dentre todas as aptidões que poderia lapidar, eu quis lapidar aquela me salvou de cada crise na qual eu não tinha ninguém pra conversar, as palavras. Eu entrei pro jornalismo porque queria escrever. Sobre tudo, sobre todos e de todas as maneiras possíveis.
Por muitos anos da minha vida eu me escondi nas minhas palavras e devorei livros e mais livros dia após dia. Hoje, sendo a boa estudante de jornalismo que acredito ser, posso dizer com propriedade que o jornalismo me fez desaprender a escrever.
Ora, meu caro colega, não ache que eu estou criticando a minha universidade ou que isso é pessoal.
Me ensinaram, com maestria, a escrever um lide. As seis perguntas fundamentais. O que um leitor quer saber? O que ele precisa saber? Confirmou aquelas informações com a fonte? Você está prestando atenção? Você consegue ver os erros de quem está já exercendo a profissão? Não os cometa, por favor, queremos que seja diferente.
Numa aula qualquer de cultura de massas, eu criei repulsa pela televisão. Não consigo assistir algo sem enxergar como um tapa na cara a manipulação implícita (ou explícita!) que aquilo dispunha. Aquela doutrinação. Cheguei a comentar isso com a professora e ela me respondeu:
– E você prefere continuar na ignorância?
Vejam, primeiro o jornalismo acorrentou minhas palavras e lhe deu um único caminho a seguir, um único jeito “ético, sério e imparcial” de me pronunciar. Depois roubou-me o descanso. Pois nada que eu veja, leia ou escute, passará por mim hipodermicamente (OI MÁRCIA!). Tudo será estudado, analisado e guardado para ser posteriormente usado, contra ou a favor de alguém.
Quem descansa trabalhando a cada piscar de olhos? Pois não importa o que esteja fazendo sempre estarei pensando na próxima pauta. Sempre cuidando cada palavra minha para não ferir o direito de expressão de ninguém e muitas vezes me calando para não ser soterrada com discursos ideológicos de quem não pode aceitar que a minha ideologia e a minha realidade fora completamente diferente da sua própria.
E talvez a maioria de vocês achem que estou falando um monte de abobrinha, denegrindo algo que já faz parte de mim, cuspindo pra cima e etc etc e tals. Mas pare para pensar… talvez o jornalismo não tenha me tirado as palavras (mas que me enferrujou na literatura, ah, isso ele é culpado!), ou você acha que estou batendo com uma banana em cima do teclado?
Talvez tudo que eu tenha dito aqui seja mentira. Ou talvez a mais pura, simples e cruel verdade. Só sei que, ao meu ver, essa é a única homenagem que posso fazer ao dia do jornalista.
Fernando
Olá Jade
Olha, que texto é esse hem.
Quando quis fazer jornalismo, pensava em trabalhar com esporte. Foi por isso que escolhi este curso. Mas nos quatro anos e meio que estou na faculdade, jamais pude escrever sobre esporte, nenhuma vez sequer e também não consegui trabalhar ou estagiar na área em que queria. Confesso que fiquei um pouco frustrado por conta disso.
Seu desabafo é bem pertinente, pois a maioria dos alunos sai da faculdade meio desencantada com a profissão. Sempre gostei de escrever de forma mais livre, mas neste sentido, o jornalismo nos acorrenta mesmo e como você falou, também não consigo ver nada sem tentar enxergar algo por trás de tudo.
Acho que escolhemos uma profissão muito boa, questionadora, mas penso que fomos vítimas, de certa forma daquele jornalismo idealista que hoje não existe mais. Hoje, o jornalismo é algo industrial, para vender, comercializar. Não existe mais, ou se existe é bem pouco, o formador de opinião.
O que existe hoje são os jornais tentando derrubar o governo, mas dizendo que são imparciais. Enfim, to escrevendo demais. Me identifiquei muito com o seu texto.
Grande abraço
Se puder siga meu blog também 🙂
Bjss
Blog Fernu Fala II
Jess
Primeira vez que venho ao seu blog e que texto incrível! Sou publicitária e, apesar de não ter os pensamentos intensos como os de um jornalista, não consigo assistir ao jornal sem perceber essa manipulação também. É bem triste às vezes. Ver que quem deveria ser imparcial defende – ainda que discretamente – algum lado da história.
Excelente ponto de vista! 🙂
Carlírio Neto
Saudações
Não sou estudante de jornalismo, nem estou em um curso superior, então possivelmente a minha opinião não conte em nada para ti. Mas, ainda assim, irei me expressar de forma direta e humilde.
Acredito que você, Jade, recebeu o ensinamento "x" em seu curso. Tu vê que, atualmente, a maioria dos profissionais da área seguem este mesmo "x" multiplicado pelo dobro de sua potência (às vezes até mais). O erro pode estar mesmo nos veículos de comunicação ou até mesmo no modo com o qual seu curso esteja sendo desenvolvido pelos responsáveis da área. Contudo, e à rigor, a data é mesmo para ser comemorada por quem ainda acredita na profissão e seu benefício pessoal e social como um todo.
Sim. A ideia é de fazer suas palavras chegarem ao mundo todo, da forma que sempre tu quis. E acredito que isto seja possível, mesmo que se sintas "acorrentada" pelo ensino ou "repudiada" em notar como os profissionais da área, em sua expressão neste texto, agem nos canais de comunicação.
As reclamações que hoje as pessoas fazem sobre o jornalismo são mais antigas do que se pode imaginar, tenha certeza disto (o YouTube apresenta muitos vídeos antigos que canalizam isto). Mesmo o jornalismo estrangeiro tem disto (palavras de quem acompanha de diversas nações). Com isso, penso eu que o problema real está um pouco além do dito emissora/ensinamento/telespectadores/ouvintes.
Não repassar em palavras qual seria o real problema sobre o que relatei acima, e por isto peço desculpas.
No mais, como estudante de jornalismo que tu és, canalize todas as informações que puder e receber. Divague entre elas. Leia/assista outros informes presentes no Brasil e no mundo. A inspiração para o todo poderá surgir, todavia, de menos onde tu possa imaginar.
Até mais!
Ohana Fiori
Agora conseguir entender o que você quis dizer sobre o jornalismo tirar as suas palavras. Eu não sei muito bem sobre o que comentar porque o texto foi muito denso e eu não tenho a noção sobre o que aprendem em jornalismo. Mas entendi perfeitamente quando você citou a televisão falando sobre manipulação, detesto a Globo e mal assisto tv em modo geral, porque a cada palavra que escuto traz aquela sensação de que eles não estão ali somente para passar a informação, mas eles querem manipular você e passar o que eles querem que você escute e/ou acredite.
Deve ter sido ruim você ter que ser "ético, sério e imparcial". Eu não conseguiria ser imparcial a algo que eu estou vendo que está errado, e eu tenho a certeza de que aquilo é errado. Tenho certeza (porque já aconteceu) de que se algo estiver sendo injusto, vai aparecer eu lá no meio brigando e/ou discutindo sobre. Eu simplesmente não consigo me calar, e fico triste por aqueles que se calam.
Espero que um dia consiga resgatar aquilo que tanto amava e foi perdido.
Um beijo no coração,
Ohana do Don't be so shy <3